O processo seletivo específico é fruto de convênio firmado entre a Universidade de Brasília e a Fundação Nacional do Índio

 

Por Millena Gomes*/Comunica FEF

 

A presença de estudantes indígenas cresce a cada ano nas universidades brasileiras e, desde 2020, também na Faculdade de Educação Física (FEF) da Universidade de Brasília (UnB). O Vestibular Indígena, como ficou conhecido o processo seletivo específico que viabiliza o acesso de membros de comunidades indígenas aos cursos de graduação da UnB, é respaldado pelo Acordo de Cooperação Técnica com a Fundação Nacional do Índio (Funai). Anualmente, é reservado para essa população até 1% do total de vagas nos processos seletivos de ingresso primário na UnB. Atualmente, a FEF conta com quatro estudantes indígenas.

 

A professora da FEF responsável pelo parecer, aprovado pelo Conselho da unidade, que orientou a faculdade a ofertar vagas no Vestibular Indígena, Dr.ª Jaciara Oliveira, explica que, desde que a política afirmativa foi implementada na FEF, são reservadas duas vagas por semestre no curso de Licenciatura em Educação Física. “Isso para a gente é, sem dúvida, uma possibilidade de contribuir com a inclusão social e com uma universidade mais democrática e plural, garantindo o direito de acesso ao ensino superior para todas as pessoas”, comenta.

 

De acordo com o último Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizado em 2010, no Brasil, existem aproximadamente 274 línguas indígenas faladas por indivíduos pertencentes a 305 etnias diferentes. A política de cotas na educação desempenha um importante papel para a inclusão dessa população no ensino superior. “A possibilidade de um estudante cursar licenciatura em uma universidade pública é muito importante do ponto de vista da formacão de educadores/as que poderão atuar na docência e na gestão das escolas que são localizadas nas aldeias e fora delas, bem como nas associações, ONGs e secretarias de educação”, diz Jaciara. A professora destaca que esses estudantes poderão ser os primeiros professores formados em Educação Física de suas comunidades, às vezes até mesmo do próprio município.

 

Alex Sander Maximiano da Silva

Discente da FEF Alex Sander Maximiano da Silva, do povo Tupinikim. Foto: arquivo pessoal

 

Os estudantes indígenas da FEF relembram e ressaltam as lutas de seus povos, como o combate ao preconceito e à discriminação, a reivindicação pela permanência de seus direitos e a demarcação de terras. O discente Alex Sander Maximiano da Silva, de 24 anos, ou Kinho, como é conhecido, diz que o vestibular indígena também é um direito e que conquistar os espaços públicos é essencial. “Ter nosso vestibular específico é algo muito importante. Para ele existir e continuar para nossas futuras gerações, lutamos muito. Foi fruto de muita luta e movimentos, não é algo que ganhamos com facilidade”, ressalta.

 

Do povo Tupinikim, o estudante também conta que, para cursar o ensino médio, precisava se deslocar da aldeia para a cidade mais próxima. Hoje, sua comunidade já conta com estrutura própria de educação formal. Alex Sander observa que há uma alta demanda pela a área de Educação Física e Saúde dentro de sua comunidade, e que escolheu o curso para levar o conhecimento adquirido na universidade até seu povo. Além disso, ressalta a importância da promoção da questão indígena. “É sobre estar e sermos capazes de enfrentar e romper barreiras em um espaço totalmente diferente do nosso”, avalia.

 

Já o estudante pernambucano Brolin Hellison Ferreira Pontes, de 21 anos, é da aldeia Fulni-ô. Lá os moradores mantêm a cultura indígena e os costumes com cânticos e a língua materna Yaathe. “Como todos os indígenas, lutamos contra o preconceito e a discriminação, a favor de nossos direitos, como a demarcação de nossas terras”, reforça. O estudante também frisa que o vestibular específico e as vagas reservadas são importantes para formar mais profissionais nas diversas áreas e levar novos conhecimentos às aldeias.

 

Acolhimento

A UnB conta com programas de apoio e acolhimento aos estudantes indígenas, além de uma Coordenação Indígena, vinculada à Diretoria da Diversidade (DIV), que realiza o acompanhamento desses estudantes na universidade, fornecendo apoio psicopedagógico e auxiliando cada um no desenvolvimento de estratégias de enfrentamento aos desafios colocados em razão de suas especificidades no ensino superior. A universidade tem ainda um Centro de Convivência Multicultural dos Povos Indígenas (Maloca), localizado no campus Darcy Ribeiro, e uma Associação dos Acadêmicos Indígenas da UnB (AAIUnB). Atualmente, a Faculdade de Educação Física conta com o projeto FEF Acolhe, que promove acolhimento aos estudantes e atividades de promoção da saúde e desenvolvimento sustentável.

 

Vestibular Indígena

A avaliação é feita por meio da aplicação de prova objetiva e de redação em língua portuguesa, além de uma fase de entrevista pessoal. Para possibilitar maior acessibilidade aos interessados, as provas ocorrem em diferentes localidades do Brasil. No último vestibular, por exemplo, foram aplicadas provas nos polos regionais das cidades de Barra do Bugre/MT (Aldeia Umutima), Brasília/DF, Caucaia/CE (Aldeia Trilho), Palmeira dos Índios/AL, Santa Isabel/AM, Tabatinga/AM e Tarauacá/AC. Confira aqui o último edital.

 

*Bolsista do projeto de extensão Comunica FEF.